Da ilegitimidade jurídica do desarmamento das vítimas

Uma explicação pela Filosofia do Direito tomista de porque é nula a legislação que procura impedir a posse de instrumentos de defesa pessoal

Segundo algumas pessoas, o Estado teria o direito de proibir a posse e o porte de armas, pois:

1 - A posse e o porte de armas não podem ser decisões pessoais porque a arma de um indivíduo pode ameaçar a segurança de outra pessoa, o que tornaria o caso competência do Estado por ser um assunto de segurança social;

2 - O uso de armas não garante a efetividade de toda defesa;

3 - A proibição da posse e do porte de armas não impediria que alguma defesa existisse, apenas impediria o uso de armas nesta defesa, o que faria com que ainda fosse possível cumprir o dever de defender-se e aos seus;

4 - Ainda que exista o dever da defesa, não há um dever de defesa com armas;

5 - A polícia pode e deve ser chamada no caso de uma agressão que só possa parada com o uso de armas, o que faz com que elas não sejam necessárias;

6 - Há um consenso geral, ou ao menos uma opinião muito difundida, de que armas são perigosas demais para ficar nas mãos de pais de família, e este consenso ou opinião comum faria com que seu uso (ou sua guarda) possa ser restrito aos policiais e soldados;

7 - Como não há distinção possível entre os vários tipos de armas (da faca à bomba atômica), é permissível que seja traçada um medida arbitrária por lei positiva definindo quais poderiam e quais não poderiam estar sob a responsabilide de indivíduos e pais de família. A discussão desta medida de direito positivo não tocaria o cerne da questão, ou seja, o direito de defesa, devido ao exposto nas razões anteriores;

8 - Defender a livre posse e porte de armas de fogo por particulares implicaria necessariamente em defender o armamento atômico por países, pois o princípio da legítima defesa aplica-se a ambos e a tentação de uso de suas armas de fogo seria maior por parte dos particulares que a de uso da bomba o seria pelos governantes;

9 - Armas não são necessariamente apenas usadas para a defesa, podendo também ser instrumentos para uma agressão;

10 - Não confiar o monopólio das armas à polícia seria "tratar com descrédito" esta instituição;

11 - Não há absolutamente nada que mostre claramente que o desarmamento irá atrapalhar na vida interna de uma sociedade inferior;

12 - Devido ao avanço tecnológico na produção de armas, sua posse não representaria mais um meio de defesa individual, mas uma ameaça à segurança social.

13 - A defesa da livre posse e porte de armas seria incompatível com a defesa da desestatização da saúde, que privaria várias famílias do
direito a uma "legítima defesa" contra as doenças, já que estas não tem como pagar por um tratamento hospitalar, bem como comprar remédios tão caros.

Ao contrário, lembro que "[e]m um mundo marcado pelo mal e pelo pecado, existe o direito à legítima defesa por meio das armas (Constituição Pastoral Gaudium et Spes, 79). Esse direito pode tornar-se um dever grave para quem é responsável pela vida dos outros, pelo bem comum da família ou da comunidade civil (Catecismo da Igreja Católica, nº 2265)".

Há na verdade três pontos principais em questão:

O primeiro é a subsidariedade. Compete à instância inferior fazer aquilo de que ela é capaz. Ora, um pai de família, desde que não lhe sejam arrancadas as armas com que deve cumprir seu dever, é capaz de repelir a imensa maior parte dos assaltos e agressões que sua família possa sofrer de criminosos. Quando não for este o caso, ele pode apelar a uma instância superior (no caso, a polícia), sem com isso eximir-se de sua responsabilidade de manter combate.

O segundo é a origem e os limites da autoridade delegada, ou seja: quanta autoridade, e delegada por quem? A instância superior recebe da inferior apenas os poderes estritamente necessários para cumprir sua missão, e não tem nenhuma autoridade sobre aquilo que é da alçada da instância inferior. Assim, memo que alguém decida pessoalmente delegar todo e qualquer aspecto de sua proteção à polícia, iso é iomposível. Ele não tem o direito ou a capacidade de tornar outra pesoa (no caso o policial) responsável por aquilo que lhe compete. Ele pode, no máximo, pedir a ajuda da polícia, mas isso não o exime de defender-se quando necessário nem permite que ele exija que a polícia o proteja em qualquer circunstância. Evidentemente, menos possível ainda seria delegar a responsabilidade de outrem de forma tão completa que a instância superior passasse a ter o direito de impedi-lo (retirando-lhe os meios que ele considera necessário) de cumprir o seu direito.

O terceiro é a responsabilidade. Assim como todos temos o dever e o direito de nos defendermos de maneira proporcional, temos o dever de evitar inflingir qualquer dano a terceiros inocentes. Não o fazer é criminoso e merece punição. É porém ilícito punir o bom pelos crimes do mau, e não se pode impedir o exercício de um direito e dever (a legítima defesa armada) com o pretexto de impedir um crime que seu abuso constitui (balas perdidas, etc.).

Resposta ao argumento 1 (A posse e o porte de armas não podem ser decisões pessoais porque a arma de um indivíduo pode ameaçar a segurança de outra pessoa, o que tornaria o caso competência do Estado por ser um assunto de segurança social):
Armas não estão vivas. O que pode constituir ameaça para a segurança de outras pessoas é o abuso das armas, que é crime e deve ser punido. Não se pode cercear um direito e impedir o cumprimento de um dever devido a um abuso cometido por terceiros. O abuso não tolhe o uso.

Resposta ao argumento 2 (O uso de armas não garante a efetividade de toda defesa):
O uso de armas não garante, é verdade, a efetividade de toda defesa. Ele é contudo indispensável para que enorme parcela dos atos de defesa seja eficaz, o que faz com que restringi-lo seja, de facto, restringir o direito de defesa e impedir o cumprimento deste dever.

Resposta ao argumento 3 (A proibição da posse e do porte de armas não impediria que alguma defesa existisse, apenas impediria o uso de armas nesta defesa, o que faria com que ainda fosse possível cumprir o dever de defender-se e aos seus):
O dever não é de fazer algum ato de defesa, de maneira simbólica, sim de procurar defender pelos meios mais efetivos que mantenham proporção com a agressão (um menino que rouba frutas não pode ganhar um tiro) e que não causem dano a terceiros inocentes (não se pode da tiros em uma multidão para impedir um assalto praticado por uma dessas pessoas). Assim, o retirar-se do pai de família os instrumentos necessário para cumprir de maneira efetiva o seu dever, o que ocorre é um impedimento de facto ao exercício deste dever, o que é proibido pela Lei Natural.

Resposta ao argumento 4 (Ainda que exista o dever da defesa, não há um dever de defesa com armas):
Há o dever de defesa eficaz e proporcional, o que na maior parte dos casos inclui o uso de armas de fogo. Se dois criminosos com barras de ferro se aproximam de meu carro na beira da estrada enquanto eu troco um pneu, a única maneira de defender-me será com uma arma de fogo. Evidentemente, só devo atirar se eles persistirem em seu intuito, mas normalmente a simple visão da arma os demoverá de sua nefanda intenção.

Resposta ao argumento 5 (A polícia pode e deve ser chamada no caso de uma agressão que só possa parada com o uso de armas, o que faz com que elas não sejam necessárias):
A polícia não é onipresente e não é capaz de transportar-se imediatamente para o local de um crime. Exigir da polícia que apareça a tempo de impedir que crimes sejam cometidos é exigir o impossível, o que faz com que não se o possa exigir. Além disso, para chamar a polícia é necessário ter meios de comunicar-se com ela, o que não é sempre o caso. É possível levar uma arma em um bolso, mas não há como comunicar-se com a polícia em uma estrada sem cobertura de telefone celular, por exemplo, sem mencionar os caos em que a pessoa simplesmente não saiba indicar à polícia onde ir por não conhecer o nome da rua ou, simplesmente, não tenha tempo de esperar ou sequer de telefonar.
Compete por isso à polícia a perseguição de criminosos em fuga após cometer um crime, sua apreensão e condução a julgamento. Mais que isso é exigir o impossível.

Resposta ao argumento 6 (Há um consenso geral, ou ao menos uma opinião muito difundida, de que armas são perigosas demais para ficar nas mãos de pais de família, e este consenso ou opinião comum faria com que seu uso ou sua guarda possam ser restrito aos policiais e soldados):
Nem mesmo um consenso geral (aliás longe de existir, graças a Deus) de todos os pais de família daria a eles o direito de eximir-se de seu dever de defender os seus. É impossível delegar completamente um dever próprio; só é possível pedir ajuda para cumprir este dever. o fato de haver uma campanha comunista que procura desarmar os pais de família não altera em absolutamnte nada o dever deles de defender-se e aos seus por meios eficazes e proporcionais. O direito de posse e porte de armas é oriundo de um dever inalienável e intransferível, o que faz com que seja plenamente nula qualquer lei que procure cerceá-lo, inda que fosse uma lei aprovada unanimemente por todos os cidadãos. Assim, se houvesse este consenso completo e esta lei nula fosse promulgada, cada pai de família que não procurasse defender-se e aos seus por ocsião de uma agressão estaria cometendo pecado mortal.

Resposta ao argumento 7 (Como não há distinção possível entre os vários tipos de armas - da faca à bomba atômica -, é permissível que seja traçada um medida arbitrária por lei positiva definindo quais poderiam e quais não poderiam estar sob a responsabilide de indivíduos e pais de família. A discussão desta medida de direito positivo não tocaria o cerne da questão, ou seja, o direito de defesa, devido ao exposto nas razões anteriores):
Compete a quem tem um dever a decisão de quais os meios necessários para cumpri-los, desde que ele não cause prejuízos a terceiros ou os obtenha por meios ilícitos (não é ilícito comprar um arma de um amigo, mas é ilícito roubar uma arma). Uma instância superior não tem direito de ingerência nesta questão não apenas por ser uma decisão individual que depende das circunstâncias (quem mora em uma fazenda pode achar necessário ter uma bazuca; quem mora em um apartamento deve procurar uma arma que não transfixie paredes, como por exemplo uma pistola .45. Aliás é absurda a proibição deste calibre por civis; ele é muito mais seguro para terceiros que o .380 ou o .38, que atravessam paredes). Justamente a enorme gama de tipos diferentes de armas e de situações em que elas seriam potencialmente úteis torna impossível a determinação de uma regra geral (que é só o que uma instância superior é capaz de fazer).
Qualquer regra geral, portanto, seria um ilícito jurídico e uma lei nula. A questão, portanto, não é uma "questão jurídica", como afirma o Roberto (ou seja, se a linha arbitrária deve ser traçada entre as facas de cozinha e os facões, entre as armas brancas e as armas de fogo ou entre as armas de fogo semi-automáticas e as automáticas), sim uma questão muito mai s garve: um Estado tirânico que se arroga o direito de ingerência em assuntos que não lhe competem.

Resposta ao argumento 8 (Defender a livre posse e porte de armas de fogo por particulares implicaria necessariamente em defender o armamento atômico por países, pois o princípio da legítima defesa aplica-se a ambos e a tentação de uso de suas armas de fogo seria maior por parte dos particulares que a de uso da bomba o seria pelos governantes):
Em termos teóricos, sim. Isto faz com que não seja condenável de per se a existência de bombas atômicas. Como porém - ao contrário de uma pistola ou revólver, que são apontados para um alvo determinado - uma bomba atômica é uma arma de destruição maciça que mata todos os que estiverem na cidade onde for detonada, seu uso normalmente é ilícito (ele seria lícito se fosse possível acrtar apenas o exército agressor em um deserto, por exemplo). Além disso, há muito mais necessidade de uma arma para um pai de família que de uma bomba atômica para um Estado. Quando à tentação de usar abusivamente a arma de fogo, ela é tanto maior quanto for o poder proporcional que ela confere a seu portador. Assim, quando as armas são proibidas por lei positiva aos particulares, aumenta a chance de abuso delas por criminosos e por maus policiais (como fartamente o comprovam as pesquisas feitas sobre o assunto). O mesmo ocorre com armas atômicas, aliás: as únicas bombas atômicas detonadas em uma guerra foram usadas pelo país que era então o único a possuir este tipo de arma.

Resposta ao argumento 9 (Armas não são necessariamente apenas usadas para a defesa, podendo também ser instrumentos para uma agressão):
O abuso não tolhe o uso. Carros também podem ser usados para atropelar, e computadores para distribuir vírus. Ah, o Iraque usa videogames para dirigir mísseis.

Resposta ao argumento 10 (Não confiar o monopólio das armas à polícia seria "tratar com descrédito" esta instituição):
Ao contrário, é dar à polícia sua justa atribuição. Justiça é dar a cada um o que lhe é de direito. É de direito que a polícia tenha armas, mas não seu monopólio, e que ela disponha dos meio necessários para fazer o que lhe compete. Ora, o que lhe compete é a apreensão de criminosos. Para isso a polícia precisa de armas, de instrumentos de perícia, etc., além de tempo. Quanto menos tarefas absurdas e impossíveis (como impedir que ocorram crimes) forem impostas pela força à polícia, mais tempo ela terá para cuidar do que lhe compete. além disso, dar a esta instituição uma missão criminosa (coarctar tiranicamente os direitos dos pais de família) é fazer dla cúmplice em um crime, o que certamente não lhe é de crédito.

Resposta ao argumento 11 (Não há absolutamente nada que mostre claramente que o desarmamento irá atrapalhar na vida interna de uma sociedade inferior):
Há, e muito (por exemplo o crescimento da criminalidade expoencialmente proporcional à diminuição das armas em poder de pessoas de bem), mas não vem ao caso. Não é porque "não há provas de que isso irá atrapalhar" que uma ingerência possa ser permitida. A usurpação de soberania, mesmo movida pela melhor das intenções e achando que "não vai atrapalhar" é plenamente nula e ilícita.

Resposta ao argumento 12 (Devido ao avanço tecnológico na produção de armas, sua posse não representaria mais um meio de defesa individual, mas uma ameaça à segurança social.):
Ver a resposta ao argumento 1.

Resposta ao argumento 13 (A defesa da livre posse e porte de armas seria incompatível com a defesa da desestatização da saúde, que privaria várias famílias do direito a uma "legítima defesa" contra as doenças, já que estas não tem como pagar por um tratamento hospitalar, bem como comprar remédios tão caros.):
Pelo contrário. O que retira das famílias a proteção contra o crime (seu desarmamento) vem da mesma fonte que o que retira delas sua capacidade de defender-se contra as doenças pelo apelo a remédios e médicos: impostos extorsivos que encarecem os remédios (sabia que remédios veterinário são mais baratos por não serem tão taxados, por exemplo?) e os tratamentos de saúde para bancar de forma ineficiente uma tentativa estatal de prover estes cuidados.





©Prof. Carlos Ramalhete - livre cópia na íntegra com menção do autor
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